segunda-feira, maio 17, 2010

Fidelidade Partidária

Embora tenha sido publicada em 25 de outubro de 2007, a Resolução nº 22.610 que trata da Fidelidade Partidária ainda deixa muitas perguntas sem uma resposta satisfatória. Faltando apenas cinco meses para o pleito de outubro em que milhões de brasileiros vão às urnas para escolher presidente da República, senadores, governadores, além de deputados federais e estaduais, o vice-presidente e corregedor do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), desembargador Cláudio Santos, chama atenção para as lacunas do documento.

Para o desembargador, a resolução deveria ser transformada em lei pelo Congresso Nacional para que as diversas brechas existentes atualmente fossem sanadas. Como, por exemplo, de que maneira o partido deve proceder caso o detentor de um cargo majoritário solicite sua desfiliação e resolva se filiar em outra legenda durante o mandato eletivo. Sobre esse caso, o desembargador afirma não ver solução jurídica caso o Ministério Público provoque a perda de mandato de um gestor devido à troca de partido ou porque ele resolveu ficar sem uma legenda.

O desembargador acredita que a resolução foi fixada para conter o troca-troca de políticos entre a situação e oposição, mas afirma ser contra a "camisa de força" imposta pela resolução aos políticos. Acerca desses e outros questionamentos sobre a Resolução nº 22.610 que trata sobre a fidelidade partidária, segue a entrevista concedida pelo desembargador Cláudio Santos.

Estamos bem próximos de mais um pleito. Como o senhor avalia a fidelidade partidária?

Desde o início eu considerei de certa forma preocupante essas normas que tratam da questão da fidelidade partidária, editada pela Justiça Eleitoral. Eu acredito que houve uma usurpação de competência pelo Judiciário de uma decisão que deveria ser do Congresso Nacional. Não há lei formal que trate o que a resolução do TSE tratou. Então, primeiramente não há a separação dos poderes como está na Constituição da República já que o Judiciário legislou e o fez, me parece, em decisão do Tribunal Superior Eleitoral, mais com o objetivo de conter uma possível debandada de integrantes do Congresso Nacional para a base que dá sustentação ao governo federal. Então o Judiciário, pelo ministro do Supremo, a quem cabe guardar a lealdade, as instituições, a consistência das instituições públicas brasileiras, resolveu agir dessa forma porque daqui a pouco nós estaríamos no Brasil praticamente sem oposição. Eu acho que esse foi o grande objetivo da Justiça com o qual eu concordo, mas com essas ressalvas.

Então o senhor acha que essa resolução foi uma forma de tentar conter os políticosnesse troca-troca entre oposição e situação?

E mais ainda com a popularidade do presidente Lula que nos seus projetos sociais terminam por galvanizar uma grande quantidade de votos, principalmente junto à população mais carente. E o único instinto do político é a sobrevivência. O político corre para qualquer lado desde que sobreviva naquele lado. Esse é o instinto de sobrevivência do político o qual não estou criticando, acho plenamente razoável o político tentar sobreviver, isso independente de ideologia, de programação, de postulados partidários. Então nesse aspecto eu acho que logrou êxito a decisão da Justiça Eleitoral, ratificada pelo Supremo. Agora o que eu digo é que ficou mal resolvida. Porque não temos democracia interna nos partidos políticos. Os partidos são monolíticos e dependem basicamente de uma pessoa ou de um pequeno grupo de pessoas que ditamtodas as regras. Então dificilmente um político vai se candidatar a algum cargo se não houver uma decisão daquele grupo. Isso não se aplica a todos os partidos. Além do mais, nós temos aqui no RN, como temos em todos os estados do Brasil, verdadeiras famílias tomando conta dos partidos. Isso demonstra que a democracia interna nos partidos é muito frágil no Brasil, embora o candidato possa ser candidato a um cargo sem está ratificada sua candidatura pelo partido, o candidato independente. Nesse caso a Justiça Eleitoral vai ter que deferir ou não essa candidatura.

Em relação aos prefeitos e governadores, por exemplo, que deixaram os partidos no meio do mandato. São casos de infidelidade partidária?

Me chama a atenção como aconteceu no RN que prefeitos ou até governador se desligarem do partido no meio do mandato. Alguns ficaram até sem partido. Até hoje eu não vi no Brasil nenhum ser substituído pelo cargo ter sido pedido pelo partido ou pelo segundo colocado. Porque quem assume no caso de um prefeito é o vice, mas a grande maioria são de outros partidos. Eles são eleitos através de uma coligação de diversos partidos. E nesse caso se o prefeito deixar o partido quem assume? É outra pessoa do partido ou é o vice? Interessa ao partido pedir sua cadeira para alguém do partido que não foi eleito ou pedir a cadeira para o vice assumir mesmo que de outro partido? O mesmo acontece com o governador. Como é que fica a situação? Nem o Ministério Público Eleitoral tomou a iniciativa de pedir o cargo porque não soube como resolver. Essas questões não são disciplinadas na legislação. O que se diz em regra é o cargo pertence ao partido, mas eu vejo que isso se aplica muito às eleições proporcionais quando a quantidade de votos dada a coligação é que elege os candidatos.

O senhor acha que essa resolução precisaria ser modificada?

Eu acho que esse assunto deveria ser melhor disciplinado pelo Congresso através de uma lei própria que tratasse, inclusive, dessa questão de fidelidade partidária que existe, mas não com o teor dessa resolução do TSE. Além do mais temos que considerar que um político que tenha mandato mesmo que ele não esteja satisfeito naquele partido, dificilmente ele poderá mudar. Quer dizer, não existe uma janela como cogitaram, que eu achava muito justo, que desse um tempo a cada quatro anos, por exemplo, uma semana para que quem quisesse mudar de partido justificar e mudar de partido. Porque as regras para mudança hoje que se configuram como justa causa, só são: incorporação ou fusão do partido com outro; criação de um novo partido; a mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário ou a grave discriminação pessoal. Eu acho que essa camisa de força que se impõe ao político dentro das atuais regras não me parece justa.

Dos casos julgados pelos tribunais regionais e TSE qual pode ser considerado uma jurisprudência?

A jurisprudência tem andado muito pendular nesses casos, cada caso é um caso. O que eu entendo que ficou meio vago ultimamente é que 32 integrantes do Congresso, às vésperas da desincompatibilização. Outros três senadores e mais 28 deputados federais, sem falar nos deputados estaduais pelo Brasil a fora. Quer dizer houve um certo esvaziamento dessas regras.

Caso o Ministério Público provocasse a perda de mandato de um desses gestores majoritários?

Não vejo solução jurídica se o MP viesse a provocar perda. Os prefeitos que ficaram sem partido, por exemplo, se enquadrariam perfeitamente porque os cargos pertencem ao partido e não a pessoa. No RN outros prefeitos deixaram uma legenda por outra no meio do mandato e os partidos e o MP não viram que solução tomar.

Um prefeito do partido A resolve apoiar o candidato a governador da legenda B, mesmo o partido A tenha um candidato próprio. Que tipo de sanção esse gestor pode sofrer?

A sanção tem que partir do próprio partido. O partido pode realmente expulsar aquele integrante. E ele perdendo a filiação partidária, consequentemente pode perder o mandato. Isso é o que pode acontecer. É considerado infidelidade, mas sob as regras dos regimentosinternos dos partidos.
DN Oline

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